sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Companhia

Chego em casa, cansado. Ombros abatidos dos fardos diários. Preciso estar só...
Absorto em pensamentos, ensaio conversações interiores, tentando despistar evidências de esquizofrenia. Divago nas pradarias verdes, nas inverdades não ditas. Crio discursos internos que sempre acabam em acaloradas trocas de ideias. Discuto futilidades e retorno ao som dos morcegos que habitam meu sótão.

Tem gente em casa. Sempre tem. Lá no canto da sala de leitura, sentado no chão, abraçado aos joelhos. Outrora lastimante e carente. Necessitado de rumo. Hoje, um companheiro. Sem demais explicações, minha mente pergunta:

-Por que não te vejo?
-Porque não estás pronto!
-Por que te escuto?
-Porque realmente estou aqui!
-Por que te sinto?
-Porque tenho algo a lhe ensinar!

Minha consciência não delimita tempos. O diálogo poderia estar completo em dois minutos. No entando, levou mais de seis meses. Uma transição lenta de medo para desconforto para comodismo para companhia. Precisavas de abrigo. Dei-te. Talvez não o aconchego da casa de um irmão, mas o suficiente para encontrares teu caminho... meu caminho. Me recompensaste o abrigo com conselhos. E com eles, voei longe.

Me deparei com situações inusitadas, agressivas, assustadoras. Por orgulho, chamei-as de receosas. Não era só receio. Eram ensinamentos. E apesar da dilatação de meus poros e eriçamento dos meus pelos, fiz o que precisava ser feito. Nem todos podem desfrutar do meu abrigo. Não só por egoísmo meu... por contigência da situação. Não tenho lar pra todo o mundo. Nem que eu quisesse. Ter um coração grande não justifica a existência de vários amantes. E foi com certa dor no peito, contrabalanceada ao alívio da alma, que deixei-o partir. Levou de mim os votos sinceros de um itinerário menos tortuoso.

Talvez eu já tenha formada a ideia que foi só o primeiro de muitos que virão... de muitos que terei... de tantos que sentirei. Mas é importante deixar claro que certos aposentos são apenas para convidados. Aos que ficaram, pedi sutilmente:

-Vão com calma. Um ensinamento por vez. A conscientização, a conversa, a sensação, o domínio sobre os métodos. Tudo leva tempo. Façamos ao meu tempo.
-Tens ansiedade de saber, de sentir, mas não de ver. Mas verás. E aprenderás a dominar tal ansiedade. A teu tempo pedes. Que a teu tempo seja!

Diálogos confusos.
Sentimentos estranhos.
Relatos esquizofrênicos.
Textos sem nexo.
Mas não pra mim!

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